20 de dezembro de 2020

Como organizar as tramas para escrever romance ou roteiro de audiovisual - e evitar o bloqueio de escritor!

Aristóteles, em seu Poética, estabelecia algumas regras essenciais até hoje para a organização da trama de uma história

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screver um romance ou roteiro de longa-metragem é um esforço que, além de vontade, demanda persistência do escritor. Serão semanas, ou provavelmente meses, de trabalho para conseguir chegar à primeira versão da obra - isso sem contar as inúmeras revisões que serão necessárias para fazê-la chegar na versão pronta para ser mostrada a outras pessoas.

Provavelmente a dificuldade de se manter motivado é o que faz com que a maioria dos escritores de primeira viagem abandonem a empreitada antes da sua conclusão, mas aliado a esta, e tão danosa quanto, é a dificuldade de se organizar para uma obra desta monta.

Mas exatamente o que significa se "organizar" para escrever um livro, e como fazer isso?

Por que se organizar para escrever um livro? E o que organizar?

Sendo bem claro: se a história não cabe inteira em sua cabeça, incluindo cada uma das tramas em separado e os perfis de cada personagem, suas motivações e ações dentro de cada trama, então você precisa se organizar.  

E lembre-se que estes detalhes todos precisam estar em sua mente o tempo todo da escrita, com as tramas e personagens evoluindo a cada página escrita.

Imagine, só para complicar, uma situação comum na vida de qualquer escritor: no meio do livro, você sai de férias, ou tem algum problema qualquer que o impede de escrever por duas ou três semanas... Na volta, como lembrar de tudo o que estava acontecendo?

Além desta questão, a organização das tramas e personagens e é essencial para oferecer ao escritor uma visão geral da história que ele está escrevendo, e de qual o papel de cada personagem nesta história.  Sem esta organização, a história fica à deriva, hora indo para um lado, hora para outro, o que pode ser exatamente o que um autor experiente deseja fazer - mas que em autores iniciantes gera a sensação de que ela não está avançando, o que acaba desembocando em um dos maiores motivos para o bloqueio de escritor: não saber como continuar. 

Mas como é que se faz, afinal, esta organização?

Para que servem as tais "ferramentas para organizar a trama" (e personagens)

Já escrevi diversos artigos sobre como elaborar personagens mais interessantes, e posso voltar ao tópico se lhes interessar (comentem!), então para tornar este artigo mais centrado, vou focar em algumas ferramentas de apoio à organização das tramas.

Antes de começar, só gostaria de reforçar o que sempre falo: As ferramentas existem para o escritor, não o escritor para as ferramentas. Não existe uma "ferramenta mágica" que vai dar um caminho perfeito para escrever uma história nem resolver as suas dificuldades criativas do autor; as ferramentas são meramente instrumentos para ajudar a tirar o máximo do seu potencial. São trilhas, que podem ser seguidas ou não, mas que dão um rumo, e nunca trilhos, que amarram o autor em uma forma padrão de trabalho. Escrever é uma atividade criativa, portanto cada escritor vai ter sua forma particular de fazê-lo.   

Um segundo ponto, tão ou mais importante que esse, é que em pelo menos um ponto crucial a profissão de escritor se assemelha em muito a qualquer outra, seja associada às artes ou não: quanto mais estudar, quanto mais praticar, melhor é o resultado do que se escreve. Parece óbvio - e realmente é! - mas há ainda muitos escritores que acham que se estudarem uma técnica qualquer de escrita, estarão "limitando a sua criatividade", "engessando sua forma de escrever" e outras coisas do gênero. Este preconceito é muito comum na América Latina como um todo, e confesso que ainda não consegui entender porque, já que aceitamos muito bem as universidades para todas as outras Grandes Artes. Se algum de vocês tiver alguma teoria a este respeito, adoraria ouvir!

E como são estas ferramentas?

Depois de falar tanto, corro até o risco de ser anticlimático ao listar algumas ferramentas, até porque elas parecem óbvias demais. Mas este é exatamente o ponto: elas parecem óbvias justamente porque fazem sentido!  Simplesmente, são formas de você fazer formalmente, conscientemente, algo que você já fazia sem registrar, fazia só de cabeça, inconscientemente. E ao explicitar o conhecimento, ele sempre se torna mais fácil e mais garantido de ser utilizado.

O primeiro ponto, central a todas as tramas, é o conflito. Toda história é sobre ALGO que aconteceu a ALGUÉM. Sem este "algo", o conflito que vale uma história, você não tem uma história. Já repeti mil vezes esta frase aqui, mas não tem como não repetir a frase de John Le Carré, escritor britânico famoso por seus romances de espionagem, falecido em dezembro de 2020:


“O gato deitou no tapete não é uma história, mas o gato deitou no tapete do cachorro, sim” 


Estando bem claro que uma história é sobre um conflito, há dois pontos cruciais que dividem a história em três partes, como já estabelecia Aristóteles em seu "poética", há cerca de 3.000 anos: Começo, meio e fim. Mais tarde, estes pontos (e outros pontos onde a história muda de rumo) foram batizados de pontos de virada.

Simples demais?  Pois é! Simples demais, mas ainda assim muita gente não segue isso...  

Vamos detalhar em alguns passos, para que fique claro como isso pode útil como ferramenta de escrita. 

  1. Pense no conflito. Para isso, é claro, você precisa estabelecer também quando a história ocorre, onde ela ocorre, quem é o protagonista e quem (ou o quê, no pior dos casos...) será o antagonista.  Registre isso em frases curtas, para ficar bem claro para você mesmo se esta é uma história que vale a pensa ser contada, e também se é a história que você quer contar.
  2. Início da história: Pense em como é a vida do protagonista ANTES de começar o conflito. Esta parte é geralmente curta, entre 5% e 10% do tamanho total da história. É aqui que o leitor vai se interessar pelo protagonista e conhecer seus valores e sua meta de vida. Escreva algumas linhas descrevendo sucintamente (isto é para você, não para o leitor) este status quo inicial.
  3. Ponto de virada inicial: Pense em como o conflito aparece na vida do personagem, qual o primeiro sinal de que a vida dele mudou ou vai mudar. É aqui que o lobo aparece na história, por exemplo. Anote uma frase curta indicando exatamente o que acontece.
  4. Meio da história: Pense brevemente em tudo o que o personagem vai passar com a mudança ocorrida, registrando em frases curtas cada uma das etapas de sua história.  Há muitas possibilidades que podem ajudar nesta parte, como por exemplo:
    • Para histórias centradas em personagem, algo semelhante aos cinco estágios do luto do modelo da psicóloga suíça Elizabeth Kübler-Ross:
      • O protagonista tentar negar a mudança e viver como vivia antes.
      • O protagonista tem raiva e luta para que a mudança não ocorra, faz ativamente força para que as coisas voltem ao que eram.
      • O protagonista tenta barganhar, ele aceita a mudança mas tenta reter algo de seu passado. 
      • O protagonista entra em depressão porque percebe que não tem como evitar o novo estado das coisas
      • O protagonista aceita o novo estado das coisas, e ou luta ativamente para se adaptar a ele, ou começa a revisar sua vida para ver o que mais precisa mudar para que se adapte.
    • Para histórias centradas na trama, pensar em outros pontos de virada como no modelo da Jornada do Protagonista, que descrevo com mais detalhes n'A Bíblia do Escritor
      • 10%: Aparece o conflito. 
      • Personagem não acredita, ou simplesmente não aceita que a mudança é necessária, e tenta continuar com sua vida - ainda que fique cada vez mais claro que isso não será possível.
      • 25%: Algo ocorre que personagem é obrigado a seguir em frente.
      • O protagonista continua reticente, sempre buscando formas de retornar ao status quo inicial.
      • 50%: Protagonista percebe que não pode mais retornar
      • A aceitação faz com que o protagonista mude sua postura e tente buscar soluções mais ativas para conflito.
      • 75%: Personagem percebe que não há soluções paliativas, precisa mudae de estratégia e resolver o conflito de vez.
      • Personagem enfrenta grandes riscos porque a estratégia de confronto direto é a mais perigosa.
      • 90%: O conflito é resolvido 
  5. Ponto de virada final: Pense em como o conflito termina. Se um lobo apareceu no passo três, ele tem que ser morto, ou sua ameaça neutralizada definitivamente de uma forma mais positiva (de repente, ele se torna vegetariano...). Novamente, uma frase curta em suas anotações vai lhe lembrar como você vê o conflito sendo resolvido.
  6. Fim da história: Pense em como será a vida do protagonista DEPOIS de resolver o conflito. Esta parte é geralmente curta, entre 5% e 10% do tamanho total da história. É aqui que o leitor vai saber como passar por toda a história realmente transformou o personagem, seu valores e sua meta de vida. Da mesma forma que nas etapas anteriores, escreva sucintamente como será este status quo final.

Se você fizer tudo isso direitinho, ao fim deste planejamento você terá algumas poucas páginas com tudo o que de realmente importante acontecerá em sua história. Ainda que você não siga suas anotações porque alguma ideia melhor apareceu no caminho, você terá um guia seguro para continuar escrevendo, pois ao saber aonde vai, você não se perderá, nem ficará bloqueado por falta de ideias.

Uma segunda ferramenta, igualmente interessante e simples, é criar um outline de seu texto. O termo, comum entre roteiristas de audiovisual, se refere a uma lista de frases curtas, uma linha cada, que descrevem brevemente cada cena.  A grande vantagem do outline é que você terá uma visão completa de sua obra antes de começar realmente a escrevê-la, e se não gostar, basta jogar 90 ou 120 linhas de texto fora e começar de novo.

Uma outra vantagem desta ferramenta é que ela atende também àqueles escritores que "não gostam de usar ferramentas". Se você não quer pensar em conflito, não acha interessante organizar a história em começo, meio e fim, e nem quer saber o que são pontos de virada, ainda assim você poderá escrever um outline para "validar" sua ideia antes de começar, perdendo assim apenas algumas dezenas de linhas, ao invés de algumas dezenas de páginas, caso perceba que a ideia não era tão boa assim, ou caso decida dar um novo rumo às coisas no meio da história. Lembro que o outline é uma trilha, não um trilho, então pode ser mudado e reescrito a qualquer ponto, conforme novas ideias surjam no correr da escrita.

Bom, espero ter ajudado a organizar algumas ideias, mas se algo não ficou claro, comente ou entre em contato, que sempre estou à disposição para esclarecer e ajudar colegas de profissão!

E você, usa alguma técnica específica para organizar suas histórias antes de começar a escrevê-las? Comente e compartilhe com os colegas escritores, pois com uma comunidade forte todos crescemos! 



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12 de dezembro de 2020

Para que servem arquétipos na construção de personagens?

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uito se fala sobre a Jornada do Herói e dos arquétipos que fazem parte dela, que muitas vezes são vendidos como uma "solução milagrosa" para criar grandes histórias: Crie a trama baseada na Jornada do Herói, defina os personagens seguindo os arquétipos e voilá!

Se você detectou uma ironia explícita, não é a toa: não acredito em fórmulas ou "soluções milagrosas" para escrever livros ou roteiros de obras audiovisuais. Pense bem: se houvesse uma solução mágica, nunca veríamos filmes de orçamentos multimilionários naufragarem nas bilheterias.

Mas então para que servem a Jornada e seus arquétipos?

Uma breve visão da utilidade da Jornada do Herói

Vale lembrar que a origem da Jornada do Herói foi uma análise realizada pelo psicólogo Joseph Campbell de um grande conjunto de mitos ancestrais e histórias mais recentes, a partir da qual ele chegou à conclusão de que todos os mitos seguem uma mesma estrutura narrativa, a que ele chamou de "monomito". Esta estrutura de 17 passos (mencionada no livro O Herói de Mil Faces) foi posteriormente adaptada por Christopher Vogler para a "Jornada do Escritor", uma versão de 12 passos utilizada pelo autor para permitir uma abordagem sistematizada na revisão de roteiros da Disney, onde ele trabalhava na época. 

É importante reforçar que a ideia de Vogler nunca foi (e ele reforça isso em suas palestras) usar a Jornada do Herói como um esquema para criar estruturas para histórias, e nem mesmo para reforçar, na revisão, a inclusão de todos os passos nos roteiros revisados, mas apenas como uma ferramenta de apoio para esta revisão, uma base de comparação para verificar se o roteiro avaliado poderia ser de alguma forma melhorado com a inclusão de algum destes passos.

O que são arquétipos, e quais fazem parte da Jornada do Herói

A palavra arquétipo vem da junção de duas palavras em grego, indicando "tipo" ou "marca" (arché) "inicial" (tipós), usada originalmente para indicar uma placa com relevos a partir da qual se realizavam impressões em pratos e objetos de cerâmica. Posteriormente, o termo foi utilizado por filósofos gregos para denominar as "ideias originais" a partir da qual todas as coisas eram derivadas - por exemplo, todos os cavalos do mundo seriam representações do arquétipo / ideia original de o que seria um cavalo perfeito.

Quando analisando os mitos que deram lugar à hipótese do monomito, com foco mais no estudo psicológico das personalidades envolvidas na jornada Campbell levantou oito arquétipos:  

  • Herói: O protagonista da história que se vê obrigado (pois faz isso reticentemente) a sair de sua vida normal e enfrentar um novo mundo, e que tem por missão enfrentar perigos mortais para trazer de volta a seu mundo um prêmio, uma recompensa, que potencialmente salva o mundo. Em nível psicológico, representa o leitor e a sua transformação é um rito de passagem para a maioridade, um aprendizado de vida. 
  • Mentor: O sábio que orienta o herói em sua jornada, e que representa a figura que o herói pode vir a ser um dia. É a imagem do pai que ensina e motiva, e morre durante a jornada do herói para dar espaço para que o herói se torne seu próprio mentor.
  • Guardião de limiar: É o que protege as entradas do novo mundo daqueles que não têm valor, e serve para testar a capacidade e o comprometimento do herói. Pode ser vencido ou transformado em uma aliado. Em termos psicológicos, representa as dificuldades interiores, os medos e as incertezas do herói.
  • Arauto: É aquele personagem (ou elemento) que anuncia a mudança por vir e os desafios a serem superados. Internamente, é a motivação do herói em conhecer e buscar superar as mudanças.
  • Camaleão: É o personagem, geralmente do sexo oposto ao do herói, que tem personalidade instável ou mutável.  Psicologicamente, é aquele que trás dúvidas e suspense, sendo por isso um catalisador de mudanças no herói. 
  • Aliado: O aliado geralmente é uma alma gentil, inocente, que enfrenta a jornada lado a lado com o herói, e que em algum ponto desiste ou desaparece, apenas para reaparecer em um momento crucial e salvar o dia. Na psicologia, representa o lado humano do herói, que traz reflexões que o lembram de como ele era antes de perder a inocência, e de como são as pessoas que ele está lutando para salvar.
  • Sombra: São personagens que, ainda não se auto identificando como "maus", enfrentam o herói na busca de evitar que ele atinja seu objetivo. Na narrativa, são instrumentos que fazem com que o herói cresça e dê o máximo de si, no lado psicológico representam as próprias dificuldades internas do herói, como suas culpas e traumas.  
  • Pícaro: Os pícaros são aqueles personagens que veem a sociedade de fora, mostrando seus pontos fracos e fazendo piada deles. Servem para mostrar os erros do herói e trazê-lo de volta à realidade, quando ele começa a se achar muito importante, sendo catalizadores de transformações de uma maneira positiva. Nas histórias servem como alívio cômico após momentos de grande tensão, e internamente representam o lado do próprio herói que questiona tudo, inclusive a si mesmo e as suas crenças.

Para que servem os arquétipos na escrita de um livro

O grande poder dos arquétipos é que eles falam diretamente ao subconsciente do leitor, e com isso reforçam a credibilidade do personagem e permitem que, com poucas palavras, o leitor saiba o que esperar de um determinado personagem.

Isto não quer dizer que seus personagens devam sempre seguir determinados arquétipos, muito pelo contrário: você deve pensar em termos de arquétipos quando definindo seus personagens justamente para ter ideias sobre quais arquétipos podem ser seguidos mais fortemente e quais arquétipos podem ser utilizados apenas para reforçar ao leitor que seus personagens são reais, diferentes de todos os demais.   

Por exemplo, ao aparecer na narrativa um velhinho com longas barbas, o leitor já vai associá-lo, pela aparência física, com um mentor. Agora, se este personagem dá um conselho bom para cada três ou quatro conselhos ruins, logo o leitor vai perceber que ele não segue aquele modelo, sendo talvez um pícaro ou mesmo um sombra.

Vale lembrar, ainda, que há muitíssimos mais arquétipos que os oito sugeridos por Campbell: A velhinha bondosa, a mãe dedicada, o executivo obstinado, o político corrupto... Pesquise na internet e você terá uma lista imensa de ideias arquetípicas, que já fazem parte do imaginário popular brasileiro ou internacional. 

O maior cuidado que você deve ter quando utilizando arquétipos para dar corpo aos seus personagens é não justamente seguir exatamente o que o leitor ou a plateia espera deles, porque senão eles se tornam estereótipos, e a obra inteira corre o risco de se tornar repetitiva e enfadonha.  

A grande vantagem de pensar em arquétipos, quando elaborando seus personagens, é que eles oferecem uma forma estruturada para se pensar em figuras recorrentes em histórias que já se encontram no subconsciente coletivo do leitor. 

Ao criar um personagem, crie um esqueleto a partir de um arquétipo, conforme a função que o personagem terá na história; e a partir daí preencha este esqueleto com músculos, pele e outros adereços de forma a torná-lo uma pessoa real, onde o leitor não verá um arquétipo, mas um conjunto de características que compõe um verdadeiro ser humano.

Para concluir, vale mencionarmos uma divertida e instrutiva frase de Christopher Vogler, brincando com arquétipos e etapas da Jornada do Herói:


“Escrever é muitas vezes uma jornada perigosa. Baixa autoestima ou confusão podem ser a Sombra que congela o seu trabalho, um editor ou seu lado autocrítico pode ser o Guardião do Limiar que bloqueia seu caminho. Acidentes, problemas de computador e falta de tempo e disciplina podem nos atormentar e provocar como Pícaros. Sonhos pouco realistas de sucesso ou distrações podem ser Camaleões que nos tentam, confundem e deslumbram. Prazos de entrega, decisões editoriais e a luta para vender seu trabalho podem ser os Testes e Desafios que fazem parecer que morremos, mas Ressuscitamos para escrever novamente” 


Espero que tenha ficado claro como você pode utilizar arquétipos como base para criar personagens melhores; mas se não, já sabe - Comente, pergunte, que estamos aqui para isso!

E você, já usou arquétipos para criar personagens? Tem alguma dica? Comente e compartilhe com os colegas escritores!



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26 de novembro de 2020

Como começar a escrever um livro?

Bom, vou começar com a má notícia: Apesar do que você pode ter ouvido por aí, não existe uma fórmula!

Se você perguntar a cem escritores como é seu processo criativo, você muito provavelmente receberá cem respostas diferentes. Para piorar, a mais comum (e frustrante) resposta sobre o processo criativo é “não tenho processo criativo”, “sigo minha inspiração” e coisas do gênero, que não ajudam muito quem está começando.

 Como se aprende a escrever livros?

A verdade é que boa parte dos escritores aprende a escrever lendo. Subconscientemente, a cada leitura, ele vai entendendo como funciona a organização geral das tramas de uma história, como é que os personagens aparecem e evoluem, como se constroem os diálogos, como aumentar e diminuir o ritmo de leitura etc.  Uma conclusão lógica, mas que sempre vale a pena reforçar, é esta: Se você quer ser escritor, comece sendo um leitor. Quanto mais você ler, melhor vai dominar os “truques da arte”.

Desnecessário dizer que é essencial que você escolha com cuidado o que vai ler. Sobre isso, vale o conselho de Francine Prose, que em seu livro “Para ler como um escritor” destaca como você pode aprofundar sua capacidade de observação, ao ler, para entender e saber usar melhor as técnicas utilizadas pelos grandes mestres:


“Eu percebi que quanto melhor o livro que estou lendo, mais inteligente eu me sinto ou, pelo menos, me sinto mais capaz de imaginar que, algum dia, poderei me tornar mais inteligente.” 



Obviamente, ainda que não exista uma “fórmula de como escrever um livro”, há muitas técnicas que ajudam o escritor a organizar seu trabalho para tirar o máximo de seu potencial.  

 E não precisa ter medo: estudar técnicas de escrita não vai "acabar com sua espontaneidade", "atrapalhar sua inspiração" nem "engessar sua forma de escrever", como temem alguns colegas - muito pelo contrário!

Vamos fazer uma analogia para ficar ainda mais claro: não há uma fórmula de como pintar um quadro. Há muitos pintores que seguem sua intuição e, apenas com isso, tornam-se bons pintores, às vezes até revolucionários. Mas há poucas dúvidas hoje de que uma formação acadêmica em Artes Plásticas ajuda os pintores a tirarem o máximo de seu potencial, ao estudarem História da Arte, Perspectiva, Figura Humana, Luz e Sombra, Teoria das Cores e muitas outras matérias associadas.

Um bom exemplo disso é o pintor Pablo Picasso, que começou como autodidata, mas mais tarde se inscreveu na escola de artes La Lonja e na Real Academia de Belas Artes de San Fernando, e muitas vezes ia ao Museu do Prado para copiar obras de grandes mestres, em busca de aprender suas técnicas.  Após dominar todas as técnicas que se lhe apresentavam, seguiu por uma linha de quebrar todas as regras que aprendeu e revolucionou toda a arte da época como um dos fundadores do cubismo e inventor de uma série de novas técnicas para produção artística. O fato de ele ter estudado as melhores técnicas que havia em sua época na área de artes plásticas não acabou com sua genialidade; na verdade, potencializou-a e permitiu que ele atingisse o máximo de seu potencial.


Seguindo com a analogia, imagine que você é um pintor e deseja começar um novo quadro. Muito provavelmente você não vai se colocar em frente à tela em branco e sair jogando tintas, esperando que algo apareça daquele caos (a bem da verdade, há uma minoria de pintores e escritores que fazem exatamente isso. No caso dos escritores, é o que é chamado “escrita intuitiva”, eu gerou muitos contos e alguns romances no início do século passado. Se você não esta neste grupo, pode continuar lendo! ).

 Da mesma forma, ao iniciar um livro, independentemente de seu processo (ou de achar que “não tem processo”) o escritor procura ter uma ideia do que vai escrever, de quais personagens vão fazer parte da história, qual os desejos destes personagens e quais grandes conflitos vão atrapalhá-los na realização destes desejos, etc.

O que é importante pensar antes de começar a escrever?  

Nesta linha, detalho a seguir alguns dos pontos que você deve pensar para ter uma visão geral de sua obra, de uma forma mais estruturada:

  • Universo da obra: Onde (em que país, cidade, bairro, o quanto for possível detalhar) sua história se passa? Em que época? Ela se passa no mundo real, ou há algo diferente ou especial no universo da história? Se for este o caso, quais são as regras que regem esta parte diferente do seu universo?
  • Status quo: Como é parte do universo mais diretamente relacionada aos personagens principais: Como é sua rotina, seu dia a dia? Onde vivem? Qual sua classe social? Em que trabalham? Como são afetados pelo governo, religião, etc?
  • Protagonista e sua meta: Quem é o personagem principal de sua obra? Quais suas características psicológicas e físicas? Qual é o seu grande desejo na vida, o que o move? Mais especificamente, qual é a sua meta na história, o que ele pretende atingir que, uma vez atingido (ou tornando-se impossível de atingir...) a história termina?
  • Antagonista e sua meta: Quem é o personagem cujas metas se interpõe no caminho dos objetivos do protagonista? Elabore, para este personagem, tudo o que você elaborou para seu protagonista. Adicionar um protagonista humano ou humanizado ajuda a criar tensão psicológica e emocional; vejam-se os exemplos dos filmes Tubarão (onde o antagonista é um prefeito que não deseja fechar a praia para não perder o dinheiro dos turistas) e Twister (onde uma equipe que busca informações meteorológicas sobre furacões, um grande desafio em si, precisa ainda enfrentar a competição de outro grupo com mesmo objetivo, mas desleal...).
  • Conflito que vale uma história: O conflito nasce naturalmente do choque das metas do antagonista e do protagonista, mas é importante você pensar especificamente sobre ele. O conflito realmente vale uma história? O leitor vai se importar com os personagens, vai querer saber o desfecho de seu conflito? 
  • Trama e pontos de virada: Com todos os pontos anteriores bem definidos, a história já começa a se delinear melhor em sua cabeça.  Para concluir esta etapa, o ideal é pensar na trama e imaginar quais são os pontos em que haverão "viradas", ou seja, os momentos em que o personagem principal precisa mudar de estratégia, precisa mudar sua linha de ação, seja porque foi forçado a isso, seja porque percebeu que o que fazia não levaria ao resultado esperado. Quando você consegue pensar nestes pontos de virada, a trama se desenha muito mais facilmente em sua cabeça.
Após pensar em cada um destes pontos, o "quadro que você vai pintar" já estará bem esboçado, e com esta ideia geral em mente fica muito mais fácil não só começar, mas também não criar uma história que fique dando voltas e nunca chegue a um fim.

Como fazer para planejar melhor o livro, antes de começar a escrever?

Caso você queira ir mais fundo, detalhar melhor este esboço antes de começar, uma ferramenta muito útil é a produção de uma sinopse

A ideia da sinopse também é simples: escreva um resumo de sua história, em algo entre meia página e cinco páginas, contando tudo o que vai acontecer. Uma grande vantagem da sinopse é que, além de lhe oferecer uma visão consolidada de todos os pontos anteriores, ela permite que você valide, antes de começar a escrever, se aquela é realmente uma história que vale a pena ser contada - ou se é melhor retornar ao início e reelaborar seu planejamento.

Por fim, caso você seja daquelas pessoas que gosta de planejar até mesmo suas férias, você pode criar um outline.     

O outline é mais que um resumo, é a descrição de cada uma das cenas de sua história. Trata-se de uma descrição breve, uma linha para cada cena, sem diálogos, descrições, nada do tipo. Por exemplo, "João encontra com Maria, mas se apaixona pela amiga dela, Tereza" pode virar uma cena de 2.000 palavras contando todo o drama interior de João naquele momento. Lembre-se: o outline é uma ferramenta para você, não para o leitor, então não precisa ser claro para mais ninguém exceto você.

Ao fim deste trabalho, você terá uma lista com dezenas ou poucas centenas de linhas, umas poucas páginas, e a história totalmente definida. Basta, agora, escrever, lembrando que se no correr da escrita você tiver uma ótima ideia que muda o rumo da história, basta volta e reescrever seu outline, sem medo de ser feliz!  

22 de novembro de 2020

Como usar cliffhangers e jump cuts para acelerar a leitura de seu livro

U

m dos maiores desafios dos escritores na atualidade é manter o leitor interessado, da primeira à última página.

Não que isso já não fosse importante para as gerações anteriores de escritores, o problema é que temos agora toda uma geração que foi criada, ou se adaptou rapidamente, às redes sociais e à conexão contínua com a internet. 

Cada vez mais as pessoas estão preocupadas em "lacrar", em entender ou resumir tudo em poucas palavras, em julgar (e divulgar) artigos longos apenas pela manchete, em não perder uma hora com algo que possa ser apreendido (mesmo que imperfeitamente) em 2 minutos. Isso é algo tão forte que estudos recentes mostram que a capacidade humana média de manter a atenção em algum post da internet diminuiu sensivelmente nos últimos anos, sendo hoje menos de 5 segundos.

Neste contexto surreal, como esperar que o leitor continue prestando atenção em seu livro?

Para isso, é essencial que o escritor estude sempre, domine pequenos truques da arte que ajudam a acelerar a leitura de sua história.

Como acelerar a leitura de um livro?

Há muitas formas de acelerar a leitura de seu livro, das mais complexas, que demandam atenção desde a organização inicial da trama, às mais simples, que podem até ser aplicadas após a escrita, durante seu processo de revisão.

Dentre as mais complexas está a criação de arcos de mudança de personagem instigantes, onde a transformação do personagem em resposta ao impacto dos problemas da trama é precisamente calculada para despertar a empatia do leitor. Para isso, além da definição aprofundada do personagem, antes do início da escrita, é importante pensar nas suas dicotomias, suas incertezas, suas falhas, pois é justamente isso que permite que o leitor reconheça no personagem alguém vivo, pulsante, que precisa - e efetivamente consegue - superar suas próprias dificuldades interiores para conseguir vencer os obstáculos que aparecem.

Ainda dentre estas mais complexas está a organização da trama de forma a atingir um crescente de ritmo e tensão no correr da obra. Para isso, é importante pensar nos pontos de virada da trama, onde o personagem muda de estratégia para tentar superar os problemas e chegar ao seu objetivo - e garantir que cada mudança gera mais atrito, mais dificuldades. Por exemplo, se no princípio o personagem segue em frente na investigação de um mistério por curiosidade, depois segue por interesse em conseguir algo, depois por necessidade de provar algo ou ajudar alguém, e ao fim para salvar a própria vida. 

Quanto às formas mais simples de acelerar a trama (no sentido de que podem ser realizadas mesmo após a obra estar escrita), podemos citar a organização da história em capítulos curtos e a revisão de parágrafos e frases para que tenhamos frases de no máximo 50 palavras, se tanto, e parágrafos que não ultrapassem sete linhas após a diagramação.  Sei que isso parece até simples demais, mas ajuda imensamente na velocidade de leitura média!

O uso de diálogos também acelera muito a leitura, então ao revisar procure oportunidades para distribuir os diálogos no correr da história.

Além disso, na etapa da revisão, é essencial cortar TODOS os excessos: de informação, de diálogos sem rumo ou propósito, de cenas que não levam à trama adiante nem servem para aprofundar um personagem etc. 

Mas há duas ferramentas que costumo chamar de "truques sujos", porque são muito fáceis de usar e, em contraste, geram um impacto imenso na tensão e na velocidade de leitura: Os cliffhangers e os jump cuts.

O que são e para que servem os cliffhangers 

Vamos começar com uma explicação bem simples sobre os cliffhangers, do escritor Dan Brown:


Cliffhangers se referem a não contar a alguém alguma coisa... e criar uma parada antes da resolução na narrativa, seja simplesmente terminando um capítulo mais cedo, ou colocando um gancho (como uma pista que o personagem estará em outro continente no dia seguinte) para manter o leitor interessado” 


É difícil ser mais claro que isso, então vamos a dois exemplos :
Terminar a cena antes da resolução: João, correndo atrás do assaltante, percebeu que ele tinha pulado a cerca do circo. Sem hesitar, atirou-se grande acima e, ao aterrissar do outro lado, continuou a perseguição para dentro da tenda principal. Assim que entrou na tenda, parou ao ouvir uma gritaria e pessoas correndo em sua direção. Assombrado, viu que um leão avançava em sua direção e, antes que conseguisse esboçar uma reação, o animal deu um bote em sua direção. 
    Uso de gancho: João se despediu de sua namorada como sempre fazia, com um beijo rápido e um sorriso. Ao subir no ônibus, voltou-se para trás e acenou, mandando mais um beijo de longe. Mal sabia que em poucos minutos sua vida mudaria para sempre.
    Perceba que, ao suspender a ação antes de sua conclusão, no momento mais tenso, ou dar uma pista de que algo imponderável iria acontecer em breve, você desperta fortemente a curiosidade do leitor, e isso vai fazer com que ele pule rapidamente para o próximo capítulo. Se você construir duas tramas paralelas, ambas terminando com cliffhangers, o leitor simplesmente não conseguirá largar seu livro, gerando o efeito que os estadunidenses chamam de "page-flipper": livros que o leitor fica passando as páginas rapidamente.

    O que são e para que servem e os jump cuts

    O termo jump cut vem da área de produção audiovisual e se refere a um corte abrupto no correr de uma cena, que a leva a uma próxima, geralmente similar ou conectada à primeira, mas que ocorre algum tempo cronológico depois.
    Apesar de não ser utilizada muito no cinema, esta técnica pode ser particularmente útil quando integrada com os cliffhangers, de forma a cortar de sua trama trechos longos que não agregam valor à história.
    Obviamente que é uma técnica que precisa ser utilizada com parcimônia, mas quando bem usada pode ajudar muito na etapa de cortes.  
    Voltemos ao primeiro exemplo sobre cliffhangers: se a história é de suspense e mistério, e a briga de João com o leão não é importante (pelo contrário, pode adicionar um elemento de ação e tensão forte no meio do história que iria desbalancear a sua trama), o próximo capítulo poderia iniciar assim:
    - O que aconteceu? Onde estou?
    - Ah, o senhor acordou? O leão o derrubou e você desmaiou com o impacto no chão, mas não sofreu nenhuma lesão maior. Você teve muita sorte. 
    "Sorte nada. O ladrão levou a única lista que eu tinha!" 
    Perceberam? Simples assim!

    Uma dica final: O livro "O Código da Vinci" de Dan Brown é uma ótima referência de estudo sobre estas duas ferramentas: não leia o livro inteiro, apenas os primeiros os últimos parágrafos de cada capítulo, para perceber como o autor usa estas ferramentas de forma magistral para gerar o máximo de tensão possível. 

    E você, alguma dúvida ou dica para aumentar a velocidade de leitura e a tensão da história? Compartilhe!



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    11 de novembro de 2020

    Por que escrever um livro? E como escrever uma biografia?

    á muitos motivos para se escrever um livro, por isso vou começar este artigo com uma frase do maravilhoso escritor brasileiro Lêdo Ivo:


    “Uns escrevem para salvar a humanidade ou incitar luta de classes, outros pra se perpetuar nos manuais de literatura ou conquistar posições ou honrarias. Os melhores são os que escrevem pelo prazer de escrever.” 


    Por que escrever um livro?

    Há aqueles que querem escrever um livro para se tornarem uma referência em sua área. 
    Faz sentido: se você vai escolher, digamos, entre duas professoras da dança, e souber que uma delas tem um livro na área, provavelmente você será tentado a escolher a que escreveu o livro.

    Há quem deseje escrever um livro para ganhar honrarias, conquistar posições, "se perpetuar nos manuais de literatura", como diz Lêdo Ivo. No fundo, escrevem para alimentar o ego. 
    O que também é uma motivação válida, tanto que há psicólogos que sugerem a escrita de diários como forma de fortalecer a autoestima e clarear suas ideias e objetivos de vida.

    Nenhuma motivação, a meu ver, vai bater aquela que vem do mais íntimo do seu ser: Escrever pelo prazer de escrever. Quando você escreve porque gosta, porque precisa disso para ser feliz, então suas palavras soam verdadeiras e vão direto ao coração do leitor.

    No entanto, há outra motivação igualmente profunda, irmã desta, que é a vontade de escrever uma biografia de alguém que se admira.

    Não são poucos os escritores em início de carreira que me procuram buscando dicas sobre como escrever uma biografia. Muitos querem contar sua própria história de vida, passar adiante as informações valiosas sobre como superaram a doença ou uma limitação física, a morte de um ente querido, ou uma vida inteira plena de dificuldades. Outros querem contar a história da mãe, a primeira caminhoneira do Brasil, o avô que foi recruta na Segunda Grande Guerra, a tia que criou do nada um movimento que transformou a vida de muitos necessitados.
     

    Há ferramentas para se escrever biografias?

    E então? Quando escrevi A Bíblia do Escritor, meu pensamento sempre foi voltado para a criação de livros e roteiros de audiovisual de ficção. Os mesmos conceitos se aplicam para biografias? Meditando sobre isso, encontrei esta frase do escritor e poeta britânico Michael Rosen:

    “... é impossível escrever a história completa e verdadeira de qualquer coisa. Sempre deixamos algo de fora. Muitas vezes, colocamos coisas a mais. Algumas vezes, não interessa o quanto tentemos evitar isso, mudamos coisas. Contamos a história da nossa própria forma, que pode não ser da mesma maneira que outra pessoa contaria.” 


    Se realmente contar uma história é questão tanto de conteúdo quanto de forma, cheguei à conclusão que muitas das ferramentas que explico no livro podem sim ser aplicadas à escrita de biografias, algumas integralmente, outras de forma adaptada.

    Algumas ferramentas para escrever biografias

    Vejamos algumas das ferramentas que podem lhe ajudar, de maneira bem objetiva, a escrever a biografia que você deseja:
    1. Definição da premissa: Todo livro de ficção começa com uma premissa, que entre outros elementos inclui o local, data, condição social etc. do personagem, e seu objetivo, o que ele busca atingir até o fim do livro. Da mesma forma, elabore isso para seu biografado, em especial o "objetivo de vida". Este objetivo vai direcionar toda a escrita da obra, pois deve transparecer nas ações do biografado e, eventualmente, aparecer em seus diálogos. Busque reforçar objetivos fortes, que conquistem o leitor. E lembre-se: mesmo que para o biografado estes objetivos não estivessem claros no início de sua vida, ficaram claros à medida em que ele foi vivendo, o importante não é ser 100% fiel a cada segundo da realidade (o que, já vimos, seria impossível de qualquer forma), mas contá-la de modo a empolgar o leitor.
    2. Definição dos personagens: Mesmo que o protagonista seja você mesmo ou alguém que você conheça profundamente, sempre há "personagens" de apoio, pessoas que participaram ativamente da vida do biografado. Crie um mapa mental para cada pessoa e um que retrate os relacionamentos entre todos, e conforme a necessidade de cada personagem, crie fichas com os dados pessoais, relacionamentos, características físicas ou psicológicas etc. porque isso servirá como referência importante no momento da escrita.
    3. Estruturação da trama: Ao escrever ficção, elaboramos os pontos de virada (PDV) de forma a criar um efeito de ritmo e tensão crescentes. Os PDV são aqueles momentos em que a vida obriga o personagem a mudar seu rumo - ou em que o personagem, por si só, decide que precisa mudar de vida. Ora, o mesmo conceito serve para as biografias: ao começar a se organizar para escrever, anote primeiramente os PDV da vida do biografado. Assim que estes momentos estiverem definidos, anote os momentos mais importantes, entre um PDV e outro, que você deseja contar. Na sequência, elabore os momentos de conexão ou outros momentos significativos. Seguindo esta estratégia, você vai terminar com uma lista de todos os momentos que você gostaria de contar em sua biografia, de forma cronológica, o que lhe permitirá ter uma visão completa da história e, com isso, se organizar melhor para escrevê-la. Além disso, esta abordagem evita que você se perca escrevendo milhares de detalhes sem importância que, de outra forma, poderiam tornar a narrativa maçante e gerar desmotivação porque você não vê a história evoluindo.
    4. Reorganização da trama: Uma vez definido o outline, esta lista com todos os pontos a serem contados, você deve revisar a trama e pensar qual a melhor forma de contar a história. Começar com o nascimento do biografado faz sentido? Ou é melhor começar por um momento super importante, como uma conquista excepcional ou a própria morte, e a partir daí retornar ao princípio? O que deve ser contado de forma sequencial, e o que pode aparecer como flashback (cenas do passado, contadas no presente) ou backstory (comentários do narrador ou diálogos onde o passado é parcialmente revelado)? Lembre-se que seu objetivo é tanto contar a história como manter o leitor interessado para que ele leia a história.
    5. Filtros de revisão: Os filtros de revisão são um bom exemplo de uma ferramenta que pode ser utilizada integralmente. Por exemplo:
      • Corte de informações: Ao revisar, corte tudo o que for "explicação" e que não colabore para aprofundar o biografado ou levar a história adiante.
      • Uso de flashbacks e outros similares: A ideia é usar o framing para reforçar a saída e entrada no flashback, sempre a partir de um elemento similar. Por exemplo, se um cheiro leva à memória que inicia um flashback, um cheiro traz as reflexões de volta ao presente.
      • Uso de Cliffhangers: Também nas biografias é importante deixar o leitor em suspense! Termine cada capítulo lançando algo que deixe o leitor curioso, seja começando a contar algo que se passou, seja deixando no ar que algo importante está para acontecer.
      • Uso dos sentidos: Vá além da descrição visual dos fatos, com um ou outro diálogo ou som importante: nos momentos mais tensos ou expressivos, em que o leitor precisa imergir mais na narrativa (à custa da diminuição do ritmo), reforce o paladar (mesmo que seja "um gosto de derrota na boca), o tato, o olfato e a intuição (o sexto sentido).
    O assunto é amplo, mas espero ter dado pelo menos algumas ideias para quem deseja iniciar um empreendimento deste tipo - e é claro que fico à disposição para responder dúvidas específicas, como sempre!       

    E você, tem alguma ideia ou dica para quem está pensando em escrever uma biografia? Compartilhe!



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    6 de novembro de 2020

    Quanto tempo demora para escrever um livro? E qual o tamanho ideal?

    E

    ste assunto merece ser iniciado por um trecho do (maravilhoso) livro "A Verdade sobre o caso Harry Quebert", de Joël Dicker:

    "- Harry, de quanto tempo precisamos para escrever um livro?

    - Depende.

    - Depende de quê?

    - De tudo."

    Para simplificar, vamos limitar um pouco este universo: falemos sobre romances para jovens adultos e adultos, ou roteiros de audiovisuais de longa metragem. Escrever livros infantis, por exemplo, é uma arte totalmente diferente, e com tempos totalmente diferentes - basta dizer que o incrível escritor e ser humano Jonas Ribeiro já passou dos 200 livros escritos, e ainda com muitos a anos de escrita pela frente.

    E para simplificar ainda mais, vamos falar especificamente sobre o ato de escrever em si, em oposição ao ato de terminar o livro, que envolve todo o tempo e esforço para pensar na ideia, pesquisar, organizar a trama, criar os personagens etc., antes de começar a escrita; e a parte de realizar as múltiplas revisões direcionadas que precisam ser realizadas após o término da primeira versão. 

    Apenas para dar alguma ideia sobre estas etapas, a maioria dos escritores com quem conversei gasta mais tempo antes e depois de escrever do que efetivamente escrevendo. E aqui vão as primeiras dicas: 

    • Estabeleça prazos e metas para suas pesquisas e organização, para não correr o risco de ficar na etapa preparatória para sempre. Pesquisar é viciante, planejar as tramas e aprofundar os personagem idem, e o escritor desavisado muitas vezes gasta muito mais tempo que precisaria nisto.
    • Crie uma lista de revisões a serem realizadas, uma de cada vez ("Cortar descrições / informações desnecessárias", "Revisar diálogos do protagonista", "Incluir participação do personagem de alívio cômico após momentos mais tensos", "Incluir sentidos (tato, olfato, paladar...) nos momentos que demandam maior imersão do leitor") e se atenha a ela. Escritores muitas vezes relutam em dar sua obra por concluída, adiando este momento indefinidamente, e definir esta lista ajuda a evitar isso.
    Sobre esta questão da duração antes e durante a escrita, vale a pena conhecermos uma frase de John Irving, romancista e roteirista "oscarizado":

    "Há muita ignorância sobre quanto demora para escrever um romance. Há muita ignorância sobre quanto tempo o romance fica na sua cabeça antes de você começar a escrevê-la" 


    Tirando-se da conta os tempos de planejamento e revisão - estes, sim, dependem de "tudo" - o que resta é uma questão simples, como explicado por Neil Gaiman :

    "Você senta na frente do teclado e coloca uma palavra depois da outra, até terminar. Simples assim, difícil assim" 


    Mas... Se escrever um livro é "só" isso, como posso (antes de escrevê-lo) medir seu tamanho e saber quanto tempo demorarei para terminá-lo? 

    Como medir o tamanho do livro

    Para dar alguns exemplos concretos, vou mostrar alguns números de alguns de meus livros:

    Livro

    Páginas

    Palavras

    no Word

    no livro impresso

    O Nome da Águia 

    (ed. Novo Século)

    287

    319

    73.500

    O Nome da Águia

    (ed. Franco)

    287

    283

    73.500

    As Incríveis Memórias de Samael Duncan

    (ed. Bagaço)

    140

    229

    46.500

    Uhuru

    (ed. LGE)

    43

    98

    15.500

    Uhuru

    (ed. Franco)

    43

    76

    15.500

    Veja bem: Fazendo as contas dos exemplos acima, os livros após editados variaram entre 158 e 260 palavras por página. Além disso, o mesmo livro publicado por editoras diferentes acaba saindo com uma grande variação do número de páginas (mais de 20% em alguns casos).

    Disso tiramos umas primeira lição importante: você não deve avaliar o tamanho de seu livro pelo número de páginas, mas pelo número de palavras

    Qual o tamanho ideal para um romance?

    A partir da tabela podemos também ter uma noção aproximada do tamanho dos livros: um livro com 73.500 palavras terá algo em torno de 300 páginas (ou seja, um livro grande, que pode assustar possíveis editoras porque será mais caro); portanto se seu livro passar de 50.000 palavras, pode contar que uma das demandas iniciais da editora será cortar uma boa parte dele. O que é ótimo, porque sempre que você corta, o que resta é a essência da história, mais interessante e impactante.

    Não é que exista um "tamanho ideal", mas esta noção de tamanho é muito importante, porque muitos escritores chegam a mim com livros de 100.000 palavras ou mais e não têm noção de que é demais, para um autor que esteja em início de carreira e procurando editoras.  

    E quanto tempo demora para escrever um romance?

    Sobre este assunto, vale muito a pena ver o que diz o escritor de ficção científica estadunidense Walter Jon Williams:

    "O tempo que se demora para escrever um livro depende de seu tamanho" 


    Parece simples demais? Sim, parece. Mas é verdade. Se você se organiza para escrever, já tem os personagens bem definidos, a trama bem elaborada, todas as cenas definidas, é tudo questão de lembrar a matemática do primeiro grau e calcular o tempo que se leva para terminar o livro a partir da sua produtividade e da quantidade média de palavras de cada cena.  

    Para isso, digamos que após organizar as tramas do livro você chegou a um total de 100 cenas. Com sua rotina de trabalho bem definida (outro requisito importante para quem ser escritor profissional), escreva algumas cenas, entre 5 e 10, e a partir daí verifique o número de palavras total e o tempo que você levou para escrevê-las.  A partir disso, é possível extrapolar o tempo que você irá levar para concluir a primeira versão do livro.  

    Por exemplo, se você escreveu 10 cenas (de um total de 100) em 15 dias, e o total de palavras chegou a 7.000 palavras, então você deverá demorar  15 x 10 = 150 dias para terminar seu livro, e ele ficará com aproximadamente 70.000 palavras.

    Se você acha que isso é "viagem", digo que não é: faço isso com todos meus livros, e todas as vezes que consegui entregar livros no prazo (já são 24 no total, sendo pelo menos 10 encomendados com prazo por alguma editora) é justamente porque fui capaz de calcular o tempo e tamanho aproximados do livro.

    Caso você não planeje, "saia escrevendo" após definir personagens. ambiente e conflito (e você não está só: Stephen King e outros nomes de sucesso têm um processo similar a este), ainda assim você conseguirá ter uma boa ideia do tempo total que vai levar para terminar seu livro de acordo com sua evolução diária e a ideia (ainda que vaga) do tamanho que seu livro terá.

    Sabendo projetar tempo e tamanho do livro, o que fazer agora?

    Ainda melhor do que saber o tamanho e o tempo para terminar um livro seria saber como, e quanto tempo demora, para se escrever um bom livro. 

    Sobre isso, podemos nos fiar no sábio conselho do escritor franco-britânico W. Somerset Maugham:   


    "Existem três regras para escrever ficção. Infelizmente, ninguém sabe quais elas são" 


    Brincadeiras à parte, o que posso dizer quanto à qualidade do que se escreve é que, como em toda profissão, nada substitui o estudo e a prática. 

    Estude, pratique sempre, persista. Um dia você irá perceber que as coisas começam a fluir mais fácil, os caminhos parecem mais claros, as portas se abrem para você.

    Neste momento, faça como eu: ajude quem está começando, porque você já vai ter a correta dimensão do tanto que coisas simples como estas têm o potencial de atormentar quem está no início da carreira.

    Mantenha a corrente do bem! 

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    21 de outubro de 2020

    Como criar bons personagens sem esforço

     Uma das grandes dificuldades, principalmente em autores iniciantes, na criação de personagens é saber o que é realmente importante no momento desta criação.  Se você gasta muito tempo e esforço, por vezes chega até a desanimar e parte do trabalho pode ser desperdiçada, se gasta pouco tempo, os personagens podem ficar pouco convincentes.

    E não falei "autores iniciantes" à toa: realmente é difícil chegar a este equilíbrio quando não se tem experiência.  
    Para tentar diminuir o tempo desta curva de aprendizado, vou destacar alguns pontos que podem fazer diferença neste momento.

    Antes de entrar na questão do equilíbrio, vou falar bem brevemente de algumas ferramentas para ajudar a criação dos personagens, e algumas de suas características.

    Ferramentas para criar personagens

    • Mapas Mentais: Muito útil para começar a criação, de forma não estruturada. Você escreve o nome do personagem no meio e começa a criar nós no gráfico, com os grupos de características que acha importante para seu seu livro, por exemplo "Características Físicas", "Relacionamentos", "Vida Profissional" etc.. Depois, vai criando os sub-grupos os características. Há várias ferramentas pagas e gratuitas para a criação destes mapas, a que eu uso é uma gratuita, que me atende bem, a Freemind.  Também pode ser utilizada de forma estruturada, caso você tenha um modelo de mapa e o use para criar mapas semelhantes para vários personagens. 
    • Questionários: A ideia dos questionários é oferecer uma visão compreensiva, completa, das características externas do personagem, ou antes "externamente perceptíveis". Assim, um questionário pode ter coisas como "cor dos olhos" e "cor dos cabelos", e também algo como "Meta de vida", "religião" ou "Principal característica psicológica".   
    • Entrevistas: As entrevistas, em oposição aos questionários, servem para explorar o mundo interior do personagem, e ao invés de respostas objetivas a ideia é realizar perguntas cuja respostas sejam pequenas histórias.  Por exemplo, "Conte como foi a primeira vez que você se apaixonou", ou "Conte o que aconteceu, e como você reagiu, na primeira vez que você ...".  Também é possível fazer uma entrevista não estruturada, gerando novas perguntas segundo os pontos que forem aparecendo nas respostas.  O ideal é escrever todas as respostas, mas alternativamente é possível simplesmente gravar as respostas, respondendo cada questão em voz alta porque a verbalização ajuda a definir melhor o perfil do personagem. 
    • Fichas de personagens: A ficha é uma das ferramentas mais comuns para criar personagens, e em essência é um mix entre os questionários e entrevistas, com algumas perguntas objetivas e outras mais subjetivas.

    Quando usar cada ferramenta

    O grande problema de praticamente todas estas ferramentas (com a honrável exceção dos mapas mentais) é que definir um personagem acaba gerando um esforço grande. Como então chegar ao equilíbrio?  Vamos a alguns pontos importante que você precisa ter em mente:

    • Nem todos os personagens são iguais: Tenha em mente que você não deve detalhar os personagens da mesma forma.  Os protagonistas e antagonistas precisam ser mais detalhados, mais reais; os secundários podem ser mais simples; já os de apoio podem até mesmo ser estereotipados, desde que não de forma exagerada.  Em termos de características psicológicas, os principais devem ter algo em torno de 3 características mais fortes, e um arco de mudança em que estas características evoluem durante a trama; já os secundários funcionam bem com 2 características e, eventualmente, um arco simplificado de mudança.  Os de apoio têm usualmente uma característica psicológica, e não mudam.  Sabendo disso, não perca tempo fazendo entrevistas, por exemplo, para todos os seus personagens! 
    • Nem todos os livros são iguais: O óbvio precisa ser dito: em livros infantis ou infanto-juvenis os personagens são MUITO mais simples; muitos dos personagens que criei para este público são perfeitamente definidos com um mapa mental e uma ficha simplificada.  Mas mesmo entre romances o aprofundamento dos personagens muda; há romances mais realistas ou com foco em personagens que demandam personagens reais, com vida própria e profunda, e para estes você realmente vai precisar deixar a preguiça de lado e escrever muito na etapa de definição para que seu personagem ganhe o coração dos leitores.  Já para romances de ação, estilo "007", os personagens são bem mais simples. Em se tratando de roteiros de longa metragem, é essencial a realização de questionários e entrevistas extensos, para dar ao ator ou atriz toda a bagagem necessária para "entrar no personagem".  
    • Use as ferramentas de forma encadeada e progressiva: Todo personagem merece um mapa mental. Os secundários merecem um questionário simplificado, e talvez uma ou outra pergunta de entrevista a respeito de suas características principais. Os protagonistas e antagonistas merecem questionários e entrevistas mais completos.  De qualquer forma, comece sempre pelos mapas mentais, depois responda nos questionários ou fichas as perguntas que fizerem sentido conforme o contexto de seu livro, e por fim parta para as entrevistas, assim o trabalho fica mais coeso e os personagens mais coerentes.  
    • Defina os personagens durante o correr da história: Se você gosta de "sair escrevendo", monte os mapas mentais e parta para o trabalho. Não é uma boa abordagem para romances, porque assim os personagens ficam meio "chapados" no início, sem muita vida, mas aos poucos eles vão adquirindo profundidade.  Se você for seguir esta abordagem, não esqueça de voltar às suas anotações e registrar respostas nos questionários toda vez que faltar uma informação objetiva sobre seu personagem, e escrever uma pergunta e resposta nas entrevistas toda vez que sentir que determinada situação merece um "background psicológico" para o personagem. Por exemplo, se de repente você percebe a necessidade de seu personagem ter um determinado medo ou complexo para dar origem a uma cena qualquer, volte e escreva a origem deste medo ou complexo. O leitor nunca vai ler esta história (a menos que isso seja significativo para o livro), mas ao escrever seu personagem soará mais verdadeiro se você escrever esta história antes de escrever a tal cena. 
    • Aproveite perfis de amigos e conhecidos, escreva só o diferencial: Bons personagens são verdadeiros, agem como pessoas verdadeiras. Ora, então um bom "atalho" na criação de personagens é utilizar algum conhecido seu como base. Pode ser um amigo, familiar, ou mesmo uma pessoa pública que você acompanhe mais de perto. O importante, neste caso, é NÃO "copiar" a pessoa, mas se inspirar nela, incluindo alguns elementos que diferenciem seu personagem. Já vi amizades acabarem pelo "uso indevido" de uma pessoa, e olhe que ela era retratada um bom personagem! Se for alguém próximo, uma boa ideia é informar a pessoa antes, e já explicar que é mera inspiração, que não é um retrato nem sua opinião sobre ela - pelo menos é o que eu faço!

        Esta técnica de utilizar amigos e conhecidos também pode ser utilizada para dar um "toque final" aos seus personagens, como destaca a escritora norte-americana Cassandra Clare, autora da série Os Instrumentos Mortais:


    "Criar personagens é como reunir ingredientes para uma receita. Eu pego características que eu gosto e desgosto em pessoas reais que conheço, ou de quem sei algo a respeito, e as uso para embelezar e definir personagens" 



    Como falei, nada substitui a experiência, mas espero que estas dicas pelo menos mostrem o caminho das pedras sobre o qual a experiência poderá ser construída de forma mais rápida. 

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    15 de outubro de 2020

    Como escolher um título para seu livro?

    S
    ó quem já passou por este drama sabe como é difícil escolher o título de um livro, ou peça de teatro, ou filme. 
    E todo este drama não é à toa, afinal, o título e a capa são os fatores que mais influenciam na compra do livro, para leitores que não conhecem o autor.

    O pior é que não existe uma regra para criar "bons títulos", até porque muitas vezes os títulos que quebram as regras óbvias acabam chamando a atenção e, com isso, se tornam mais atrativos.
    Ou não!
    Como falei, não há regras.

    Mas se não há regras, de que adianta falarmos sobre isso?  Ora, basta nos inspirarmos nesta frase do romancista estadunidense John Steinbeck,g autor de livros como "As Vinhas de Ira" e "A Leste de Éden", e ganhador do Nobel de literatura em 1962:


    "Ideias são como coelhos. Você consegue um par e aprende a lidar com elas, e muito rápido você terá uma dúzia" 


    Portanto, ainda que não haja regras para criar o "título perfeito", ainda assim falarmos sobre o assunto com certeza o ajudará a chegar a um título que pode ser o perfeito para seu livro.

    E desta vez vou precisar de ajuda de vocês, até para garantir a "variedade genética" destes "coelhos" que estou soltando aqui, o que com certeza tem o potencial de gerar uma descendência mais rica de ideias!

    Vamos, então, a algumas coisas que andei pensando a este respeito. Se você está precisando definir o título do seu livro neste momento, sugiro ir anotando todas as palavras e ideias que aparecerem a cada ponto, porque mesmo que a ideia para seu título não nasça agora, tudo isso servirá de insumo para que sua criação, mais tarde. 

    Como você resumiria seu livro em 30 palavras? E em 10? E em 5?

    Qual é a essência de sua história? Veja bem, a essência não é O QUÊ você contou em seu livro, mas SOBRE O QUÊ se trata a história. Por exemplo, Huckleberry Finn, de Mark Twayn, não é um livro sobre dois amigos que sobem o rio Mississipi em uma balsa, é uma história de amizade e uma crítica á sociedade racista da época; Moby Dick, de Herman Melville,  não é uma obra sobre a caça de uma baleia, é um conto sobre quão longe a fúria e a vingança podem levar um homem.
    Desta forma, busque resumir a essência de seu livro em poucas palavras, e vá ampliando este raciocínio até chegar ao coração de sua obra. 
    Orgulho e Preconceito, de Jane Austen, é um bom exemplo de título criado a partir desta ideia. 
    Já os outros dois que mencionei são curiosos: O título é meramente o nome de um personagem. Hoje em dia, isto não se usa muito, mas sempre é mais uma ideia para colocar em seu "caldo"...

    Qual o sentimento que seu livro desperta no leitor?

    Nesta mesma linha da "essência" de que falei, uma outra possibilidade é buscar o sentimento principal que seu livro desperta. Paixão? Medo? Angústia? Anote em sua lista de ideias, e a partir do sentimento busque algum conjunto de palavras que desperte este sentimento no leitor. Por exemplo, a partir de "agonia", "incômodo" ou "dor", seria possível chegar a um título como Navalha na Carne, de Plínio Marcos.

    Busque palavras de impacto 

    A partir das ideias dos pontos anteriores, e dos próximos, busque sinônimos de alto impacto. Uma ótima ferramenta para isso, que sempre utilizo, é o Thesaurus do Word: Abra um novo documento, escreva a palavra que servirá de ponto de partida, e clique com o botão da direita do mouse sobre ela. Selecione no menu que aparece a opção "sinônimos e "Dicionário de Sinônimos", que o editor de texto irá abrir seu Thesaurus na lateral do documento. Aí, você pode fazer a festa, navegando por todas as palavras relacionadas, e a partir delas para outras, anotando todas as que têm o potencial de impressionar o leitor.  Por exemplo, a partir de "força" você encontra "impacto", "influência", "energia", "violência"... Ao selecionar "influência", você encontra "inspiração", "pressão", e por aí vai.

    Use anacronismos e outras técnicas para despertar a curiosidade do leitor

    Um título que traga ideias anacrônicas tem o potencial de despertar a curiosidade do leitor deste o primeiro momento.  Veja, por exemplo, Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal AquinoA Cor do Invisível, de Mário Quintana, ou Até que a morte nos una, de Jonathan Tropper.
    Mas nem só de anacronismos vivem bons títulos. A inglesa Catherine Webb, sob o pseudônimo de Claire North, criou alguns títulos memoráveis neste quesito, justamente por contarem tudo, e não contarem nada, a respeito de seu livros. Em português há dois que merecem destaque: A súbita aparição de Hope Arden e As quinze primeiras vidas de Harry August (aliás, lindamente escritos). E aí, despertaram sua curiosidade ou não?   

    Quais os títulos de livros do seu gênero?  

    Como em quase qualquer coisa na vida, uma boa e velha pesquisa de campo sempre ajuda a ter novas ideias. Vá a uma livraria, física ou virtual, e procure livros do mesmo gênero que o seu.  Quanto mais específicos para seu nicho, seu público-alvo, melhor.  
    Anote todos os títulos que te impressionarem e coloque-os no caldo que estamos fazendo até agora!

    Converse com leitores e escritores

    Umas das melhores fontes de ideias - e validação do título - são aqueles que lerão seus livros. 
    Hoje em dia é muito fácil fazer, inclusive, uma enquete no Instagram, Facebook ou outra ferramenta para que você tenha uma visão estatística sobre quais títulos de trabalho geram o maior impacto dos leitores.
    No entanto, acredito que a conversa um-a-um ainda seja a mais rica, justamente porque dá ensejo ao nascimento de novas ideias.
    Desta forma, assim que você pensar em algum título (que chamamos de "título de trabalho" até que o livro seja publicado), comece a  conversar e ajustar o título.
    Por exemplo, o meu primeiro romance, O Nome da Águia, começou com o título de trabalho "A Guerra dos Filhos da Luz contra os Filhos das Trevas", título do famoso "rolo da guerra" encontrado entre os pergaminhos do Mar Morto, em 1947. Quando conversando com um possível leitor, ele me falou que este título parecia um título de um livro de Cordel, e como não era a associação que eu procurava, mudei o título para "Os 14 Messias", que me pareceu bastante bom até um segundo possível leitor comentar, ainda durante a escrita do livro, que seria interessante ter um elemento que aparecesse em todos os tempos da trama histórica do livro. Daí, um pouco mais de pesquisa me levou à Águia (nas bandeiras ou símbolos do Império Romano, Alemanha Nazista, na França de Napoleão, bandeira da Valáquia e outros momentos), que acabou me levando ao título final.   

    Use poucas palavras - ou não!

     Bons títulos são como microcontos: impacto máximo em texto mínimo. Stephen King é mestre em títulos assim, como Louca Obsessão (Misery), Desespero e Insônia.
    No entanto, há muitos títulos longos que acabam funcionando muito bem, muitas vezes até por conta da estranheza que causam.  Neste grupo os exemplos são muitos, como A Sociedade Literária da Torta de Casca de Batata, de Mary Ann Shaffer, A peculiar tristeza guardada num bolo de limão, de Aimee Bender, ou O Lar da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares, de Ransom Riggs.


    Voltando então ao que falei logo de saída: Não, infelizmente não há regras fixas para criar títulos impactantes, que despertem a curiosidade do leitor.
    O melhor que podemos fazer é juntar coelhos, ou melhor, ideias, a esperança de que deste caldo nasça aquele título perfeito.

    Neste sentido, peço que traga seus coelhos para este caldo. 

    Como você faz para escolher os títulos de seus livros?



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