22 de novembro de 2020

Como usar cliffhangers e jump cuts para acelerar a leitura de seu livro

U

m dos maiores desafios dos escritores na atualidade é manter o leitor interessado, da primeira à última página.

Não que isso já não fosse importante para as gerações anteriores de escritores, o problema é que temos agora toda uma geração que foi criada, ou se adaptou rapidamente, às redes sociais e à conexão contínua com a internet. 

Cada vez mais as pessoas estão preocupadas em "lacrar", em entender ou resumir tudo em poucas palavras, em julgar (e divulgar) artigos longos apenas pela manchete, em não perder uma hora com algo que possa ser apreendido (mesmo que imperfeitamente) em 2 minutos. Isso é algo tão forte que estudos recentes mostram que a capacidade humana média de manter a atenção em algum post da internet diminuiu sensivelmente nos últimos anos, sendo hoje menos de 5 segundos.

Neste contexto surreal, como esperar que o leitor continue prestando atenção em seu livro?

Para isso, é essencial que o escritor estude sempre, domine pequenos truques da arte que ajudam a acelerar a leitura de sua história.

Como acelerar a leitura de um livro?

Há muitas formas de acelerar a leitura de seu livro, das mais complexas, que demandam atenção desde a organização inicial da trama, às mais simples, que podem até ser aplicadas após a escrita, durante seu processo de revisão.

Dentre as mais complexas está a criação de arcos de mudança de personagem instigantes, onde a transformação do personagem em resposta ao impacto dos problemas da trama é precisamente calculada para despertar a empatia do leitor. Para isso, além da definição aprofundada do personagem, antes do início da escrita, é importante pensar nas suas dicotomias, suas incertezas, suas falhas, pois é justamente isso que permite que o leitor reconheça no personagem alguém vivo, pulsante, que precisa - e efetivamente consegue - superar suas próprias dificuldades interiores para conseguir vencer os obstáculos que aparecem.

Ainda dentre estas mais complexas está a organização da trama de forma a atingir um crescente de ritmo e tensão no correr da obra. Para isso, é importante pensar nos pontos de virada da trama, onde o personagem muda de estratégia para tentar superar os problemas e chegar ao seu objetivo - e garantir que cada mudança gera mais atrito, mais dificuldades. Por exemplo, se no princípio o personagem segue em frente na investigação de um mistério por curiosidade, depois segue por interesse em conseguir algo, depois por necessidade de provar algo ou ajudar alguém, e ao fim para salvar a própria vida. 

Quanto às formas mais simples de acelerar a trama (no sentido de que podem ser realizadas mesmo após a obra estar escrita), podemos citar a organização da história em capítulos curtos e a revisão de parágrafos e frases para que tenhamos frases de no máximo 50 palavras, se tanto, e parágrafos que não ultrapassem sete linhas após a diagramação.  Sei que isso parece até simples demais, mas ajuda imensamente na velocidade de leitura média!

O uso de diálogos também acelera muito a leitura, então ao revisar procure oportunidades para distribuir os diálogos no correr da história.

Além disso, na etapa da revisão, é essencial cortar TODOS os excessos: de informação, de diálogos sem rumo ou propósito, de cenas que não levam à trama adiante nem servem para aprofundar um personagem etc. 

Mas há duas ferramentas que costumo chamar de "truques sujos", porque são muito fáceis de usar e, em contraste, geram um impacto imenso na tensão e na velocidade de leitura: Os cliffhangers e os jump cuts.

O que são e para que servem os cliffhangers 

Vamos começar com uma explicação bem simples sobre os cliffhangers, do escritor Dan Brown:


Cliffhangers se referem a não contar a alguém alguma coisa... e criar uma parada antes da resolução na narrativa, seja simplesmente terminando um capítulo mais cedo, ou colocando um gancho (como uma pista que o personagem estará em outro continente no dia seguinte) para manter o leitor interessado” 


É difícil ser mais claro que isso, então vamos a dois exemplos :
Terminar a cena antes da resolução: João, correndo atrás do assaltante, percebeu que ele tinha pulado a cerca do circo. Sem hesitar, atirou-se grande acima e, ao aterrissar do outro lado, continuou a perseguição para dentro da tenda principal. Assim que entrou na tenda, parou ao ouvir uma gritaria e pessoas correndo em sua direção. Assombrado, viu que um leão avançava em sua direção e, antes que conseguisse esboçar uma reação, o animal deu um bote em sua direção. 
    Uso de gancho: João se despediu de sua namorada como sempre fazia, com um beijo rápido e um sorriso. Ao subir no ônibus, voltou-se para trás e acenou, mandando mais um beijo de longe. Mal sabia que em poucos minutos sua vida mudaria para sempre.
    Perceba que, ao suspender a ação antes de sua conclusão, no momento mais tenso, ou dar uma pista de que algo imponderável iria acontecer em breve, você desperta fortemente a curiosidade do leitor, e isso vai fazer com que ele pule rapidamente para o próximo capítulo. Se você construir duas tramas paralelas, ambas terminando com cliffhangers, o leitor simplesmente não conseguirá largar seu livro, gerando o efeito que os estadunidenses chamam de "page-flipper": livros que o leitor fica passando as páginas rapidamente.

    O que são e para que servem e os jump cuts

    O termo jump cut vem da área de produção audiovisual e se refere a um corte abrupto no correr de uma cena, que a leva a uma próxima, geralmente similar ou conectada à primeira, mas que ocorre algum tempo cronológico depois.
    Apesar de não ser utilizada muito no cinema, esta técnica pode ser particularmente útil quando integrada com os cliffhangers, de forma a cortar de sua trama trechos longos que não agregam valor à história.
    Obviamente que é uma técnica que precisa ser utilizada com parcimônia, mas quando bem usada pode ajudar muito na etapa de cortes.  
    Voltemos ao primeiro exemplo sobre cliffhangers: se a história é de suspense e mistério, e a briga de João com o leão não é importante (pelo contrário, pode adicionar um elemento de ação e tensão forte no meio do história que iria desbalancear a sua trama), o próximo capítulo poderia iniciar assim:
    - O que aconteceu? Onde estou?
    - Ah, o senhor acordou? O leão o derrubou e você desmaiou com o impacto no chão, mas não sofreu nenhuma lesão maior. Você teve muita sorte. 
    "Sorte nada. O ladrão levou a única lista que eu tinha!" 
    Perceberam? Simples assim!

    Uma dica final: O livro "O Código da Vinci" de Dan Brown é uma ótima referência de estudo sobre estas duas ferramentas: não leia o livro inteiro, apenas os primeiros os últimos parágrafos de cada capítulo, para perceber como o autor usa estas ferramentas de forma magistral para gerar o máximo de tensão possível. 

    E você, alguma dúvida ou dica para aumentar a velocidade de leitura e a tensão da história? Compartilhe!



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