3 de junho de 2016

Como evitar atalhos que enfraquecem seu texto


H
oje temos no Vida de Escritor um texto muito elucidativo da amiga escritora Daniele Ribeiro.
Em breve voltamos com novidades!
Quem já se aventurou no mundo da escrita criativa já deve ter escutado a orientação “mostre ao invés de contar”. O escritor mostra o que está acontecendo em sua história quando, em vez de simplesmente descrever um personagem, permite que a própria reação dele a algum acontecimento permita que o leitor conheça um pouco mais de sua personalidade. Mostrar um personagem tendo um ataque de fúria ou uma atitude educada é mais efetivo do que explicar pro seu leitor que ele é uma pessoa de pavio curto ou uma pessoa gentil. É claro que usar uma frase pra descrever alguém ou alguma situação é mais rápido e torna o texto mais sucinto, mas tomar esse atalho pode enfraquecer e muito o impacto que você quer causar no leitor. “Achar que você precisa explicitar tudo é o melhor caminho para entediar o leitor.
Um atalho muito comum é o uso dos advérbios. Os advérbios são aquelas palavrinhas que explicam o verbo. Isso é considerado um recurso pobre e até mesmo preguiçoso porque o próprio desenrolar na narrativa deveria suprir essa função. É como aquele comediante que explica a piada, só pra ter certeza de que a plateia entendeu. O contexto da história é que deveria evocar na mente do leitor as emoções e intenções do personagem. É muito mais instigante pro leitor poder captar essas informações nas entrelinhas do que receber o texto “mastigado”.

Então como fugir da tentação de tomar esses atalhos? Um recurso muito interessante é o uso de metáforas e comparações. Além disso, é sempre válido lembrar que as atitudes dos personagens falam por si só. Na vida real, as nossas expressões faciais, posturas e gestos são responsáveis por 55% de toda a comunicação. Então, uma dica é: Deixe que seu leitor leia também as expressões e a linguagem corporal dos seus personagens.

No livro “Extraordinário”, de R. J. Palacio, as atitudes de August logo no início da história mostram muito de sua personalidade infantil. Como o personagem-narrador é uma criança, a linguagem simples é o que predomina o texto. Além disso, as atitudes e falas da mãe demonstram o afeto e o instinto de proteção dela pelo filho, sem que isso precise ser explicado ao longo da narrativa. Leia o trecho abaixo em que seus pais tentam convencê-lo a começar a frequentar uma escola e perceba como o escritor mostra a dinâmica do relacionamento entre eles sem precisar recorrer a advérbios como “gentilmente”, “afetuosamente”, ou simplesmente explicar o carinho e zelo que a mãe tem por August:

“— Querido — disse a mamãe. Ela se virou para trás no banco do carona e segurou minha mão. — Você sabe que, se não quiser, não tem que fazer isso. Mas conversamos com o diretor da escola sobre você e ele quer muito conhecê-lo.
— O que vocês disseram sobre mim?
— Falamos de como você é divertido, gentil e inteligente. Quando contei que você leu O cavaleiro do dragão aos seis anos, ele disse: “Uau! Tenho que conhecer esse garoto.”
— Você disse mais alguma coisa? — perguntei.
Mamãe sorriu e seu sorriso foi como um abraço
.”

Daniele Ribeiro nasceu no Rio de Janeiro, mas mora em Brasília desde 2011 onde é servidora pública. Apaixonada pela literatura, participou de uma das edições do “Workshop de Escrita de Ficção” ministrada por Alexandre Lobão e de uma oficina de escrita onde produziu diversos contos, além de possuir um romance em produção.

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2 comentários:

Renata disse...

Excelente texto, realmente muito elucidativo! De fato, se a história vem muito mastigada, torna-se enfadonha. Mas confesso que às vezes tenho receio de pecar abusando das metáforas ou deixando no ar algo que deveria ser esclarecido. Imagino que, com a prática, aprende-se a dosar melhor os recursos para que o resultado final fique mais interessante.

Um abraço.

Alexandre Lobão disse...

É bem por aí, Renata. Este equilíbrio de que você fala faz parte do estilo de cada autor; a mais importante mensagem aqui é que você deve conscientemente procurar tal equilíbrio, e não fazer as coisas "por instinto" e, sem perceber, aquém do seu melhor.
Obrigado!